1. TRABALHO INFANTOJUVENIL E SAÚDE -
As Possíveis Implicações do Trabalho na Saúde de Crianças e
Adolescentes
CARMEN RAYMUNDO
Assistente Social do Programa de Saúde do Trabalhador Adolescente
Universidade do Estado do Rio de Janeiro/UERJ.
Núcleo de Estudos da Saúde do Adolescente/NESA
2. O NESA é o setor da UERJ
responsável pela atenção
integral e multidisciplinar à
saúde de adolescentes na faixa
etária entre 12 e 20 anos de
idade. Oferece atendimento nos
níveis: primário, secundário e
terciário. Tem como missão a
formação de recursos
humanos. Atua desenvolvendo
ações de assistência, docência
e pesquisa, em níveis de
graduação e pós-graduação
3. PROGRAMA DE SAÚDE DO
TRABALHADOR ADOLESCENTE | NESA/UERJ
Linhas de Ação:
• Atenção Integral à Saúde
• Formação de Recursos Humanos
• Desenvolvimento de Pesquisas Multidisciplinares
• Impacto em Políticas Públicas
4. “As crianças e adolescentes das camadas subalternizadas
sempre trabalharam neste país, desde a colônia, o Império, a
constituição da República, até os dias atuais,
para seus donos, no caso das crianças escravas da Colônia e do
Império; para os “capitalistas” do início da industrialização,
como ocorreu com as crianças órfãs, abandonadas ou
desvalidas a partir do final do século XIX; para os grandes
proprietários de terras como bóias-frias; nas unidades
domésticas de produção artesanal ou agrícola; nas casas de
família; e finalmente nas ruas para manterem a si e as suas
famílias. (IRENE RIZZINI, 1999:376)
5. PROMULGAÇÃO DO ESTATUTO DA CRIANÇA E ADOLESCENTE – LEI
FEDERAL Nº 8069/90
REDE DE PROTEÇÃO E DE GARANTIA DE DIREITOS INFANTOJUVENIS
6. MARCO LEGAL BRASILEIRO
• De acordo com a legislação nacional,
expressa na Constituição Federal de
1988, na Consolidação das Leis
Trabalhistas (CLT), no Estatuto da
Criança e do Adolescente (Lei
Federal 8096 de 13/06/1990,
alterada pela Emenda Constitucional
n° 20) é proibido o trabalho realizado
por pessoas abaixo de 16 anos de
idade.
• No entanto, é permitido o trabalho
entre 14 e 16 anos, desde que na
condição de aprendiz
7. Aos adolescentes de 16 a 18 anos é
assegurado o início da vida laborativa desde
que seja no trabalho protegido, isto é, fica
para estes vedado:
• Trabalho noturno, realizado entre as 22 horas de um
dia e as cinco horas do dia seguinte.
• Trabalho perigoso, insalubre e penoso.
• Trabalho realizado em locais prejudiciais à formação e
desenvolvimento físico, psíquico, moral e social.
• Trabalho realizado em horários e locais que não
permitam a freqüência à escola (ECA, art. 69)
MARCO LEGAL BRASILEIRO
8. Decreto n.º 6.481 de 12 de junho de
2008 – Estabelece as Piores Formas
de Trabalho Infantil
• Elenca 94 atividades;
• Vigência: a partir de 11 de setembro
de 2008;
• Novidades em relação à Portaria n.º
20/2001: trabalho doméstico, serviços
externos que impliquem em manuseio e
porte de valores, cuidado e vigilância de
crianças e pessoas idosas ou doentes,
entre outros.
MARCO LEGAL BRASILEIRO
9. Ações de Saúde para Atenção Integral à Saúde de Crianças e
Adolescentes Economicamente Ativos
PERÍODO: 2004/2012
•Promulgação da Portaria MS
777/2004 atual 104/2011
•Elaboração de Diretrizes para a
Atenção Integral à Saúde de
Crianças e Adolescentes
Economicamente Ativos
(Ministério da Saúde, 2005)
10. • O investimento na formação de profissionais
•A notificação do evento trabalho infantil através da ficha
de Violência Doméstica, Sexual e/ou outras Violências
Interpessoais, no ano de 2006.
•A celebração do Termo de Cooperação Técnica entre o
Ministério da Saúde – MS - e o Ministério Público do
Trabalho – MPT – no ano de 2010 para os casos de agravos à
saúde ocorridos com crianças e adolescentes em situação de
trabalho
11. Crianças e adolescentes
economicamente ativos - conceito
Meninos e meninas com idade até 18 anos que
contribuam para a produção de bens ou serviços,
incluindo atividades não remuneradas, qualquer
que seja a forma de inserção no mercado de
trabalho, nos setores formais e informais da
economia.
12. Conceito Ampliado de Trabalho
Conceito que abrange as atividades
informais, ilegais, os trabalhos
domiciliares, familiares, as atividades
consideradas “ajuda”, não remuneradas
ou com benefícios secundários, como
casa e comida.
13. Trabalho e suas singularidades
É essencial considerar as peculiaridades
existentes entre as várias regiões do país;
entre os territórios rurais e urbanos; entre as
diferenças de gênero, etnia e classes sociais
para a compreensão dos significados do
trabalho infanto-juvenil.
14. Por que discutir a categoria trabalho é importante quando
tratamos da saúde de crianças e de adolescentes?
15. Magnitude do Problema
No Brasil existem 3,3 milhões de crianças e adolescentes em situação
de trabalho.
Esse contingente representa 8,1% das pessoas entre 5 e 17 anos de
idade.
PNAD/IBGE 2014 (Pesquisa Nacional de Amostragem Domiciliar)
16. Magnitude do Problema
A maior parte dos casos de trabalho infantil do país está concentrada no Nordeste
(33,2%) e Sudeste (31,4%).;
O estado de São Paulo tem o maior número absoluto de casos: 461.876. É seguido
por Minas Gerais (378.050), Bahia (291.978) e Rio Grande do Sul (214.766);
Crianças e adolescentes negros representam 62,5% do total no trabalho em geral e
73,4% no doméstico;
Do total de pessoas entre 5 e 17 anos trabalhando em 2013, 64,7% eram do sexo
masculino e 33,3% do sexo feminino
PNAD/IBGE 2014 (Pesquisa Nacional de Amostragem Domiciliar)
17. Principais Ocupações com presença de Trabalho Infanto-juvenil
1. Lavoura e pecuária - 41%
2. Comércio, reparação (veículos, equipamentos
domésticos etc) - 17%
3. Industria de Transformação (alimentação, vestuário,
calçados etc) – 7%
4. Serviços domésticos – 8%
5. Lixões – 0,44%
6. Tráfico de drogas
18. ASPECTOS INVISÍVEIS DO TRABALHO INFANTO-JUVENIL
• Quanto mais precoce é a entrada no mercado de trabalho
menor é a renda média obtida ao longo da vida adulta
• Ocorrência de acidentes de trabalho e problemas de
saúde relacionados ao trabalho em crianças e adolescentes
trabalhadores
• Manutenção e agravamento dos níveis de desigualdade
social
19. QUAIS SÃO AS POSSÍVEIS SITUAÇÕES DE
RISCO À SAÚDE?
20. O Processo saúde, doença e
trabalho infanto-juvenil
• Exposição
• Aspectos subjetivos e
coletivos da socialização
21. Fatores vulnerabilizadores
no trabalho
- agentes físicos (ruído, desconforto térmico-frio etc),
- agentes biológicos (bactérias, vírus, fungos, animais peçonhentos),
- agentes químicos (agrotóxicos, poeiras, solventes, tintas, etc),
- agentes fisiológicos (sobrecargas física e mental);
- da organização do trabalho (a duração da jornada, os modos de trabalhar- ritmos
de trabalho, as más posturas corporais durante o trabalho, a repetitividade das
tarefas etc).
22. Os adolescentes e jovens
são particularmente
vulneráveis aos agravos
advindos do ambiente de
trabalho e, portanto,
mais sujeitos a doenças
ocupacionais.
Vulnerabilidade
23. As crianças e
adolescentes que
trabalham estão mais
vulneráveis ao
desenvolvimento de
doenças originadas por
agentes biológicos. Isto
se deve a menor
capacidade de defesa
contra microorganismos
pela imaturidade do
sistema imunológico.
Sistema Imunológico
24. Os limites recomendados
para exposição
ocupacional a agentes
químicos não são
aplicáveis ou apropriados
para criança e
adolescentes. Eles tem
menor capacidade de
metabolizar as
substâncias químicas
porque seus sistemas
enzimáticos ainda estão
em formação.
Limites e Exposição a substâncias químicas
25. A atividade de trabalho pode ser fonte de
inibição para o desejo de brincar.
O brincar cumpre na infância um papel muito
maior do que a diversão, pois fornece a
oportunidade de reviver, entender e assimilar os
mais diversos modelos e conteúdos das relações
afetivas e cognitivas.
Quando obrigados a atender exigências do
trabalho, expostos precocemente a um
ambiente cerceador, os mais jovens podem
desenvolver uma baixa autoestima.
O trabalho diminui o tempo disponível ao lazer,
a vida em família, educação e convivência com
seus pares e outras pessoas da comunidade.
Sofrimento Psíquico
26. Acidente de Trabalho
Quanto mais jovem o trabalhador, maior o risco de
acidente de trabalho, na medida em que:
- Desconhece ou não tem controle sobre os riscos a
que está exposto.
- Não possui a experiência necessária para lidar com a
atividade de trabalho.
27. Acidente de Trabalho
- Apresenta comportamento destemido e corajoso.
- Está submetido a maior precariedade das condições
de proteção no trabalho.
- Máquinas, equipamentos, ferramentas e postos de
trabalho são projetados para trabalhadores adultos, e
não estão adaptados às características psico-anátomo-
fisiológicas da criança e do adolescente.
28. Segundo a OIT e a OMS (1984) referem-se estes às
interações entre: o ambiente de trabalho, o conteúdo do
trabalho, as condições organizacionais, as relações no
trabalho (com a chefia, colegas, tipo de contrato, tipo de
remuneração, o assédio moral e sexual), as necessidades
das crianças e adolescentes particularmente, no que diz
respeito às suas tradições, à cultura, as repercussões do
trabalho na convivência familiar, na frequência e
desempenho escolar, no acesso a atividades
extracurriculares, nas possibilidades de lazer e de
convivência com seus pares.
Fatores psicossociais no trabalho
29. Processo de Trabalho Situações de Risco à Saúde
• Plantio, colheita, carregamento de
produtos, limpeza da terra.
• Exposição à radiação solar, calor, umidade, chuva.
• Picada de insetos e animais peçonhentos.
• Levantamento e transporte manual de peso excessivo,
manutenção de posturas inadequadas e movimentos
repetitivos.
• Exposição a agrotóxicos.
• Acidentes com instrumentos perfuro cortantes
• Jornadas prolongadas.
Atividade Econômica: Agricultura
30. Processo de Trabalho Situações de Risco à Saúde
Limpeza da residência, áreas externas e
utensílios domésticos; preparo de
alimentos e cuidados com crianças,
muitas vezes sem recebimento de salário
e com jornada excessiva.
Esforços físicos intensos; isolamento; abuso físico, psicológico e
sexual; longas jornadas de trabalho; trabalho noturno; calor;
exposição ao fogo, posições anti ergonômicas e movimentos
repetitivos; tracionamento da coluna vertebral; sobrecarga muscular
e queda de nível .
Atividade Econômica: Serviços Domésticos
31. POR QUE OS ADOLESCENTES TRABALHAM?
As construções culturais e ideológicas
A relação com a escola
A busca de autonomia e independência
O consumo
A violência
32. POR QUE OS ADOLESCENTES TRABALHAM?
Pertencimento, identidade, visibilidade social
Esperanças, direitos e oportunidades
33. O NÃO DIREITO AO TRABALHO
MORADOR DE ÁREA NÃO VIOLENTA
Em certos lugares, quando vou procurar emprego, preencher ficha, eu boto Jacarepaguá, não boto Cidade de Deus,
não. Prejudica, pode prejudicar.
(Grupo focal com jovens, Rio de Janeiro)
PRECONCEITO
“Pra um jovem de comunidade entrar pra um trabalho no meio dos burgueses, não dá. Já acham que é bandido ou
que tem algum parente que é bandido. E a mídia contribui pra isso. Em se tratando de jovem de comunidade, já tem
um olhar preconceituoso. Se você é negro e tem vinte caras junto com você, esse olhar já vem pra você”.
EXPERIENTE
O que falta pra gente, também, é a falta de experiência, porque eles não dão oportunidade e muitos de nós também
não têm uma profissão ainda, aí fica difícil. Fazendo Formação Geral, a gente vai sair daqui sem nada, sem
qualificação nenhuma, teria ainda que fazer curso de inglês, informática... (Grupo focal com jovens, Rio de Janeiro).
DE "BOA APARÊNCIA"
Quem tem uma aparência assim, como a minha fica desempregada pro resto da vida. E outra: você tem que ter um
corpo bom pra poder usar a própria roupa da loja. Porque a pessoa tem que ser magrinha, não pode ter barriguinha,
tem que ter corpinho bom que dê para colocar... (Grupo focal com jovens, Rio de Janeiro).
"CLARINHA"
Em algumas lojas assim, eles até avisam, no caso: Ah! Pô, arruma uma pessoa pra trabalhar comigo. Só que não pode
ser negra. No máximo, moreninha jambo, clarinha.
(Grupo focal com jovens, Rio de Janeiro).
34. O que representa o trabalho para esses jovens?
Qual a história de trabalho familiar?
Que consequências o trabalho pode trazer à saúde e a
freqüência escolar?
Que significados eles atribuem ao trabalho e a si
mesmos enquanto trabalhadores?
Como o trabalho interfere nas relações estabelecidas
com suas famílias? E com seus amigos?
Como o fato de trabalharem afeta a necessidade de
tempo livre?
35. Quais as possíveis contribuições
do SUS às ações para erradicação
do trabalho infantil, e construção
de trabalho protegido para
os adolescentes?
36. As contribuições do SUS
- Posição privilegiada para a identificação e o acolhimento de
crianças e adolescentes em situação de trabalho;
- Realização de ações de atenção integral à saúde visando a
promoção, a proteção, a recuperação e a reabilitação;
- Desenvolvimento de ações de educação em saúde sobre o
tema;
- Avaliação dos possíveis relações entre o trabalho e as
questões de saúde apresentadas;
- Estabelecimento de ações de vigilância em saúde;
- Articulação intersetorial e interinstitucional.
40. Ficha De Notificação / Investigação
Individual Violência Doméstica, Sexual
E/Ou Outras Violências
41.
42.
43. Principais contribuições da Atenção
Básica
- Principal porta de entrada no Sistema de Saúde;
- Territorialização;
- Contribuição para as ações de vigilância em Saúde do Trabalhador;
- Mapeamento dos processo produtivos
- Fomento a articulação intra e intersetorial.
PORTARIA Nº 2.488, de 21 DE OUTUBRO DE 2011
44. Questões referentes ao trabalho infanto-juvenil
que podem ser levantadas pela equipe Atenção
Básica
Qual o perfil ocupacional das famílias no território?
Quantas famílias realizam atividades produtivas em seu domicílio?
Quais as atividades produtivas domiciliares no território?
Quantos e quem são as crianças e adolescentes no território?
De que adoecem e morrem as crianças e os adolescentes no
território? Quantos são trabalhadores? Em que atividades produtivas
estão inseridos? Quais as situações de risco à saúde a que estão
expostos?
45. O número absoluto de crianças que trabalham, bem como de adolescentes
que trabalham em condições ilegais (sem respeito à condição de aprendiz
ou às condições de proteção definidas em lei) ainda é muito alto;
O recuo nos índices de ocupação das crianças e adolescentes de 10 a 15 está
cada vez menor.
As pesquisas da PNAD revelam a persistência de um “núcleo duro” no trabalho
infantil, composto por crianças e adolescentes no trabalho familiar não
remunerado na agricultura e nas atividades informais urbanas;
A exploração de crianças e adolescentes no comércio sexual, narcotráfico e
trabalhos em condições análogas à escravidão ainda permanece no cenário
brasileiro sem dados estatísticos precisos;
Novo perfil/configurações distintas trazem para os diversos setores a exigência
de ações diferenciadas de enfrentamento .
DESAFIOS
46. O Brasil tem agenda pública para a erradicação do trabalho infantil desde os anos 90 e
apresentou bons resultados, mas vem perdendo fôlego na sua capacidade de avançar.
Entre as principais causas pode-se destacar:
•Ampliação da rede de proteção social e melhora no acompanhamento das
crianças por meio de políticas públicas, retardou a entrada no mundo do trabalho,
diminuindo horas trabalhadas, mas não alterou a decisão de muitos adolescentes
de buscar trabalho e acesso a recursos;
•40% do trabalho infantil não se relaciona diretamente à subsistência da família;
•Diminuição do trabalho em empresas, e ocorrência do trabalho no âmbito
familiar e dos empreendimentos informais;
•Aumento do trabalho infantil nas regiões metropolitanas;
•Necessidade de adoção de novas articulações entre sociedade e governo para
avançar na erradicação do fenômeno por meio de novas ações públicas;
47. ELEMENTOS POTENCIALIZADORES DAS AÇÕES DE
SAÚDE
•Informação para ação: diagnóstico epidemiológico, demográfico,
político e social dos territórios;
• Sensibilização / Capacitação;
• Investimento na atenção básica (estratégia de saúde da família
e agentes comunitários de saúde);
• Fomento ao trabalho em rede intersetorial.